A Noruega não merecia


Nenhum país merece uma tragédia desta, mais há países por natureza beligerantes, vide USA, a Noruega, não. A Noruega é um país exemplo de pacifismo e democracia, um país de tradição tolerante, uma nação generosa, que por este perfil foi escolhida por Alfred Nobel para fazer em seu território, anualmente, a entrega do prêmio da paz. A Noruega é reconhecida mundialmente como a nação que mais faz doações a países pobres em proporção de seu PIB. E não para por aí, é também o país que mais recebe asilados políticos no mundo, aceitando 40% de todos os pedidos, conforme informa Duda Teixeira da VEJA.

E logo um país como este, sem apego militarista, dirigido por uma elite tolerante, e certamente, o mais politicamente correto do mundo, vai ter a infelicidade de produzir o Sr. Anders Behring Breivik, autor do massacre na Ilha de Utoya, distante há 40km de Oslo.

Efetivamente, a Noruega por suas características não merecia tamanha tragédia. No entanto, no mundo atual nenhuma nação está livre dos fundamentalistas, nem mesmo aqueles países pacifistas, eles – os radicais    estão por todos os lados, aqui mesmo no Brasil vivemos a tragédia da Escola de Realengo, no Rio de Janeiro;

Anders Breivik é um fanático convicto, um ultranacionalista para quem “os judeus patrocinam a invasão da Europa por imigrantes islâmicos”. E daí? Será que não podemos viver em paz no mundo? Tenho muito medo dos convictos radicais, aqueles que não duvidam de nada, nem mesmo de suas convicções.

É notório que as tragédias dos dias atuais estão intimamente ligadas às convicções inabaláveis, à falta de hesitação. Colocar esta tragédia e tantas outras na conta da religiosidade inerente ao humano é um despropósito. Um ser sadiamente religioso é um ser por natureza cercado de misericórdia e de dúvidas, sempre ciente de que poderia ser melhor e não o é, portanto, um ser cujas poucas convicções só o podem conduzir à fraternidade amorosa. Qualquer religião – sadia – está sempre a pregar o amor, o encontro, a transcendência, jamais a eliminação do outro.

O ódio é sempre uma anomalia.  O que se há de frisar é que os fundamentalismos de todas as vertentes são nocivos. O fundamentalismo não é uma doutrina, mas uma forma de interpretar e viver a doutrina. Como diz Leonardo Boff, “o fundamentalismo representa a atitude daquele que confere caráter absoluto ao seu ponto de vista” (“Fundamentalismo – a globalização e o futuro da humanidade”. Rio de Janeiro: Sextante, 2002, p. 25).

As dúvidas fazem muito menos mal do que as convicções, talvez seja isto que assuste tanto os cidadãos do século XXI. Num século marcado por dúvidas de todos os lados e perspectivas, de fato, não é confortável permanecer nesta condição, por isso muitos ainda são saudosistas das convicções absolutas de outrora. Os tempos são outros, e democracia se constrói a partir do exercício da dúvida, do dissenso, do direito à verdade e também de convicções. Não são elementos estanques, porém, interdependentes. É neste diálogo de idéias muitas vezes contrapostas que devemos exercitar nossa capacidade de viver juntos num mundo globalizado.

Nem todos suportam tantas dúvidas, daí radicalizam. O advogado de Anders Breivik disse hoje que seu cliente é louco. Concordo. Infelizmente, porém, não é o único nem o último dos convictos. Muitos estão por aí à solta exalando ódios e convicções e nenhuma dúvida, conclusão: mais tragédias. A Noruega não merecia...

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