Viajar de avião
Há algum tempo viajo de avião, ainda, que esporadicamente. Lembro-me ainda da primeira vez. Estávamos de férias e fomos a Fortaleza e Recife, com escala em Salvador. Nossas poltronas eram as primeiras, e Isadora um neném de colo, com direito inclusive, a berçinho gentilmente ofertado pela Varig.
Ao nosso lado, da outra banda do corredor, sentou-se um casal cujo simpático e pançudo marido tomava uma garrafinha de uísque, logo batemos papo, confidenciei a ele que era minha primeira viagem de avião, ao que de pronto respondeu: − dá uma golada aqui pra relaxar. Não aceitei, não gosto de uísque, se fosse um vinho, quem sabe.
De lá para cá, viajei algumas vezes, geralmente para idas em congressos. Pousei com chuva, sem chuva etc, um pouso com chuva no Santos Dumont não é muito confortável. Tudo ia bem, até que um dia me fiz uma pergunta que não deveria ter feito: − e se eu quiser descer durante um voo para dar uma relaxada, como eu faço? Pronto, entrei em pânico. Sei que vão dizer, mas é transitório, pois digo eu com ares de infinito. Vi que a pergunta era insolúvel. Perguntas insolúveis sempre me assustam.
A vontade que eu tinha e tenho, é durante aquele “silêncio” do voo, levantar da minha poltrona e perguntar: − como podem vocês estar com estes rostinhos “tranquilos” - muitos até dormindo - se não podemos sair daqui para dar uma voltinha lá fora? Onde vamos parar com tanta hipocrisia! Depois deste fatídico dia minhas viagens de avião perderam a paz e diminuiram a frequencia. Voltei para o analista. Espero querido leitor que você, sinceramente, não se faça essa maldita pergunta.
A hipótese de o avião cair nunca me assustou, afinal, caiu e acabou. Porém, o meu pânico está no fato de ficar trancafiado dentro daquela geringonça. A sensação que tenho é que estou subindo num elevador de mil e quinhentos andares, tipo aqueles prédios megalomaníacos de Dubai. Um elevador, sim, um elevador que não para.
Ainda não o cruzei o atlântico, já me falaram que ali – em direção a Europa - não dá para parar mesmo. Não gostei da hipótese. Sei que é loucura minha e que todos ali dentro estão conformados com o “enlatamento voluntário”, no entanto, que há algo de estranho naquele negócio, há. Que me compreendam os apaixonados pelo ato de viajar de avião.
No mundo atual quem não se submete ao ato de voar, está literalmente ilhado, azar do mundo moderno. O meu conforto é que tal “dúvida vivencial” não contaminou a família, de maneira que aqui todos gostam de viajar de avião. A última a voar foi Sarah, que chegando a Joinville, pegou o celular e ligou imediatamente para mim: − Pai, andar de avião é muito show! Nossos filhos e nossas realizações, kibon!
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