Pablo, o arquiteto



No começo era uma simples inclinação para o desenho, no entanto, com o passar dos dias e dos anos foi se consolidando uma vocação nata para as invencionices de Pablo. De jovem talentoso a arquiteto formado pela Universidade de São Paulo. Pablo ademais se destacou na universidade pela habilidade com os traços e o forte engajamento pelas causas sociais.

Comunista convicto, Pablo viveu intensamente o seu tempo. Sua geração transcorreu em meio a um período conturbado da história política brasileira e mundial. O mundo de então era dividido entre esquerda e direita. Pablo era de esquerda. Nunca se manifestou sobre sua opção religiosa, nem se dizia ateu nem crente e muito menos agnóstico, não se ligava nessas coisas.

Ao contrário, seus amigos formaram em grande parte uma geração de ateus, traço natural dos comunistas que viviam embevecidos com as lições de Karl Marx para quem a “religião é o ópio do povo”. Pablo vivenciou isso tudo, mas preservava uma absoluta discrição sobre este pormenor.

Arquiteto consagrado não no Brasil, mas em todo mundo, Pablo foi contratado para desenhar construções de todas as espécies: museus, cidades planejadas, estádios, prédios, parques e igrejas de todas as vertentes religiosas. Como não poderia ser diferente, após a entrega de cada belo trabalho, sucediam as entrevistas para jornais e revistas, e pronto, a pergunta sempre inevitável: ─ “O que inspirou o senhor na realização destes traços tão marcantes e únicos desta obra?” Pablo respondia: ─ “meu encanto pela vida e pelas curvas que a arquitetura me permite realizar” ─ respondia em tom categórico.

À medida que a fama ia granjeando espaço mundo afora, e que os prêmios também pululavam aos borbotões, evidentemente, que Pablo era chamado a opinar sobre o mundo e sua forma de o ver, afinal qual o sentido de tão ímpar e grandiosa arquitetura. Pablo, não era afeito a entrevistas, mas também não se esquivada de todo, vez por outra, taciturnamente, explicava suas motivações: ─ “a pessoa humana, o sofrimento dos pobres, a beleza da natureza, a solidariedade humana”, enfim, estes eram os valores que motivavam Pablo. Mas e a transcendência, o indagavam: ─ “isso não vem ao caso”, declarava Pablo.

Quis o destino e a genética que Pablo completasse 100 anos de uma vida feliz e produtiva. bem debilitado pela idade, comemorou a festa em família, com a presença de filhos, filhas, netos, netas, bisnetos, muitos amigos e até a presença da imprensa, que fez questão de cobrir a ocasião tão especial. No momento de apagar as velinhas – que não eram poucas - a família reunida em voz alta – Pablo quase não mais ouvia – indagou a Pablo o que gostaria de ganhar de presente pela passagem dos 100 anos de sua existência. Pablo com um olhar melancólico e vazio, no entanto, reflexivo respondeu: ─ “a edição de um livro com todas as fotos das Igrejas que construí mundo afora”.

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