Há consultas e consultas

Note você que me lê, que há diferentes reações segundo o tipo de consulta se está a proceder no campo da saúde. Já havia notado? Que bom, então vamos conferir.

Consulta no ortopedista: geralmente é um grande bate papo, os mais ousados chegam até a contar como foi os detalhes da queda, não antes de receber um beliscão de discrição da patroa. Consulta no dermatologista: discreta, porém à vontade, os pacientes ficam ali sendo suas revistas com semblante ameno aguardando à hora de seu atendimento. Consulta de psicanalista: geralmente a sala de espera já possui um clima clean, com tão-somente um no máximo aguardando a vez, analista bom não deixa mais de um na espera, geralmente se for mulher, de óculos escuros e com os cabelos jogados sobre o rosto. Consulta de cardiologista: bem descontraída, os pacientes já sabem o que tem, tomam ou não tomam os remédios, mas se olham com confiança, resignação e alegria na cura. Consulta de Psiquiatra: muita discrição, pouca conversa para não demonstrar sua “loucura” para o outro, e muita ansiedade, muita! Consulta de Odontologista: Chata, porém, necessária, aquela sensação de o dever está acima de tudo, se houver amizade, os pacientes trocam até de celulares na recepção. Consulta de Pediatra: uma choradeira danada, mães uma, mas linda do que a outra, naquela concorrência que só os homens ‘conhecem’, e aquela troca de farpa típica da ideologia materna: “minha filha dorme à noite toda”, “não chora nem quando está com febre”, “nunca teve uma dor de barriga que a tirasse dessa paz”, “Ah, o pai, um santo, lava, passa, dá banho e troca fraldas.”


Consulta no Centro de Tratamento Oncológico (CTO) de Petrópolis. Várias pessoas na recepção, um silêncio de templo budista (as igrejas cristãs não gostam do silêncio), não há conversas paralelas, os pacientes só conversam com seus parentes que o acompanham, um olhar sempre de checagem de minuto a minuto no pacote de exames, um desassossego na posição das pernas e dos braços, a cada porta que abre e o médico (a) chama o próximo, é nítido o olhar de todos para aquele “próximo”. Na saída, uns olham novamente, outros, abaixam os olhos. Mesmos os curados, são discretos. No CTO não há lugar para extravagância de gestos, a vida ali pede silêncio, comedimento e reflexão, porque ela (vida) lá está no entroncamento exato da não vida.

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