Série "Os filósofos e Deus - KANT"




O alemão Immanuel Kant (1724-1804) é uma das figuras centrais da filosofia moderna. Com Kant a teoria do conhecimento recebe um grande impacto, porquanto não se orientará mais o conhecimento pelos objetos, mas sim, pelo homem, e por sua capacidade racional de conhecer que Kant denomina de conhecimento transcendental, ou seja, “pensar transcendentalmente é indagar pelas condições de possibilidade do conhecimento de objeto determinado no próprio sujeito deste conhecimento.

Em outras, palavras, indagar transcendentalmente é mostrar como o material recebido de fora, pelos sentidos, é transformado mediante a atividade do sujeito cognoscente em objeto do conhecimento” (Cf. Urbano Zilles. Filosofia da Religião. 5ª ed. São Paulo: Paulus, 2004, p. 45).

Esfacela-se a verdade objetiva e nasce assim a idéia da verdade subjetiva criada pelo homem e sua capacidade de conhecer. Kant cria a chamada razão pura e a razão prática; na primeira emito juízos científicos de como as COISAS SÃO; na segunda, por força de uma necessidade metafísica arraigada no ser, emito juízos de como as COISAS DEVEM SER. Assim o que eu não posso provar pela razão pura torna-se um postulado da razão prática.

Deus é para Kant da ordem da razão prática. Com isto, sai de cena o pensamento teocêntrico medieval que unia fé e razão e entra no palco moderno o humanismo antropocêntrico, onde fé e razão estão dissociadas, uma vez que para Kant a religião é do mundo dos valores, razão prática, sendo impossível provar-se cientificamente a existência de Deus, restando à religião e, por conseguinte a fé, um lugar privado e subjetivo em cada cidadão e não uma pertença na esfera pública e objetiva.

A religião como “sistema de valores” pregada por Kant produziu ao longo do século XIX e XX centenas e mais centenas de seitas e credos de todas as naturezas, afinal como diz Peter Kreeft, se a religião é pura subjetividade de cada um por que alguém deveria preferir a variante cristã a outras mais simples e com uma moral mais fácil e menos inconveniente? Cf. (Menu filosofia, disponível em http://www.icones.com.br/astra/filo/index.html).

Muito embora seja cristão protestante, Kant despersonifica Deus, despersonifica Jesus e até mesmo os textos bíblicos (Cf. Prof. Carlos Ramalhete, "Kant e a Religião", http://www.hsjonline.com/kant.html), para Kant a palavra de Deus não é revelação divina, mas sim a fonte do imperativo moral (A regra de ouro de Kant, princípio central de toda sua idéia de moral é: “não farás aos outros aquilo que não queres que te façam”.) que existe dentro de nós.

Para Kant o homem é o centro, logo, conhecer Deus é conhecer aquilo de Deus que pode ser descoberto dentro do homem. Deus não é mais a revelação externa ao homem, mas sim a fonte do princípio moral ingresso no coração do homem. Veja caro leitor e leitora como Kant inverteu as coisas: não é mais Deus que se revela ao homem por nosso Senhor Jesus Cristo; mas ao contrário, é o homem que descobre em si algo que o conduz a um Deus incognoscível, uma moral universal que lhe é inata e subjetivada.

Noutro dizer: não podemos conhecer Deus, contudo, podemos reconhecer uma lei moral em nós fruto de nossa razão prática. Kant dissolve a religião na moralidade, com expressões do tipo: “Deus não é um ser fora de mim... Deus é a razão moral prática.” (Cf. Urbano Zilles, op. cit. p. 57). Deus está em mim, nasce assim a idéia que a modernidade tanto preza o humanismo moderno ou o humanismo ateu como prefere denominá-lo Henri de Lubac (Cf. Apud. Henrique C. de Lima Vaz, SJ. Humanismo hoje: tradição e missão. Belo Horizonte: Síntese, v. 28, nº 91, 2001).

Pode haver humanismo sem Deus? Não. Eis aí a encruzilhada que Kant nos legou, deixando-nos aprisionados em “um infinito salão de espelhos” como quer Peter Kreeft.

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