CTI liberado!



Era o que ouvíamos toda noite, pronunciado pela voz de zeloso filho de uma pessoa internada: “CTI liberado!”, era a senha para que levantássemos em busca dos crachás para visita. O ritual se repetia toda noite, aguardava-se a liberação da visita por quase quarenta minutos, os rostos apreensivos iam se sucedendo, e as amizades divididas pelo sofrimento se consolidavam aos poucos, lentamente, como a recuperação dos internados.

Quase todo dia ele estava lá em visita a sua mãe, que já estava há mais de sessenta dias na UTI (digo eu), ele não dizia UTI, mas sim CTI. Simpático, conversava com todos na espera, e sempre desejava melhoras aos familiares. Apenas uma noite não o encontrei na recepção, e sinceramente, senti falta de seu brado corajoso: “CTI liberado!”. Não querido leitor, não era necessário que ele assim o fizesse, a própria funcionária do hospital comunicava o momento exato da liberação, porém, ele como já tinha também amizade com a recepcionista, detinha o privilégio (legítimo digo eu) do monopólio da informação, e quando o interfone tocava, ele já estava lá à postos, ao lado da recepcionista, para nos convocar a todos: “CTI liberado!”.

Todas as vezes que ele assim dizia, eu me levantava mais corajoso do banco de espera, e rumava em direção à ‘minha’ UTI, e o ‘CTI’ dele. No caminho do elevador, não raro ele me estimulava: ─ olhei sua mãe ontem, ela me pareceu bem melhor, falando de forma carinhosa. Eu sorria e agradecia a gentileza, e pensava comigo, é a sua força e sua disposição que nos encoraja.

Nas primeiras noites a cada aviso, “CTI liberado!” o meu coração disparava, o intestino me avisava que estava funcionando, um misto de suor e frio batia em mim, coração disparava, mas nada que me impedisse de rumar junto aos outros em direção à UTI. O ritual do lavar as mãos, passar álcool, a troca de olhares silenciosos e preocupantes faziam parte do grande enfrentamento de uma UTI.

A morte no mata de uma só vez, uma UTI nos corrói aos poucos, no entanto, aquela é vencida pela ressurreição, e esta pela recuperação, vitória da segunda. Não escutarei mais o meu amigo dizer: “CTI liberado!”, mas levarei comigo aquela disposição dele para os novos desafios que se impõem. A você amigo deixo um Deus abençoe para sua mãe e um afetuoso desejo de que a sua amada mãe possa sair do ‘CTI’ fruto de uma recuperação, quando então bradarei a você, como agora: “Quarto liberado!”.


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